Tudo o que se passa hoje não passa de mais uma zona de turbulência nesta milenar existência dos humanos. Mas porque nós não somos tão humanos assim, ou se o fomos não o somos mais, eu prefiro ver-nos como umas coisas com aspeto de humanos e comportamentos de andróides.[1]
Eu diria que a existência humana é mais tipo milionar ou bilenar[2] mas o que importa é que nascemos selvagens e hoje, milhões de anos após, continuamos com uma costela selvagem bem dimensionda. E por isso mesmo não nos deixemos impressionar pela crueldade perpretada por coisas como o Estado Islâmico, por insensibilidades extremas patenteadas por gentinha como o jeitoso Nicolás Maduro, que vê fleumaticamente o seu povo em cada vez maior agonia, ou pela descontração do mesmo muito descontraído Donald Trump[3] a praticar estes joguinhos de guerra com o monstro papa-tudo de olhinhos em bico, essa tremenda máquina capitalista de origens maoistas que se dá pelo nome de República Popular da China[4].
Estamos cada vez mais andróides por quanto estamos cada vez mais agarrados a esse maravilhoso bloco construído com derivados de petróleo e ligas metálicas maquiavélicas, tanto mais sofisticadas quanto mais maquiavélico é o pensamento humano. Claro que como fã do sistema Android não refiro aqui o iOS, essa maçã mecânica da concorrente Apple Inc tanto ou mais tremenda máquina capitalista que os chinoquinhas ali ao lado da muralha mais comprida do mundo. Somos o que queremos ser e nada nos tem impedido disso porque simplesmente estamos no topo da cadeia alimentar. Vemos pelo olhos de um telemóvel, respiramos pelas narinas de um telemóvel, ouvimos pelos tímpanos de um telemóvel e sentimos pelos sensores de um telemóvel. E ainda bem que os telemóveis não têm boca porque senão nos papavam pela certa. Somos o que os Trumps, os Kim Jong-un, os Maduro e os Xi Jinping de hoje e de ontem querem que sejamos e seremos o que idênticos desses no futuro quererão que sejamos.
Estamos cada vez mais artificiais, mais vidrados nas formas e muito pouco nos conteúdos. Estamos cada vez mais dissimulados, mais encenados, mais pixelizados em busca da alta resolução, mais «giga» ou «tera»[5] porque bits já não nos conduzem ao orgasmo o qual cada vez menos acontecerá pelos orgãos genitais[6] e muito mais pelos dedos. E aí sim, estaremos no auge da era digital. Aí sim, teremos atingido os pontos G e os designados por outra letra qualquer, teremos atingido o climax, a nossa total plenitude. E já ninguém reparará nas imagens passando na TV dos Maduro que atropelam com carros de combate os seus próprios povos, nos refugiados morrendo em alto-mar e sendo transformados em comida de tubarão… Aí, ninguém estará sequer a olhar para a TV porque nessa era a televisão já era.
As pequenas turbulências de hoje são que nem turbulência em viagem de avião. Uma luz “fasten your seat belt” que se acende, uma voz de uma hospedeira de bordo toda sexy que nos acalma dizendo que é apenas uma ligeira turbulência e voilá… Já foste, tudo bem, estamos prontos para outra. Afinal, quem quer demorar-se muito a pensar na desgraça? Muito menos quando é a dos outros, né?
Que os deuses nos amenizem a existência…
- Um derivado de Android, sistema operativo de uma determinada gama de telemóveis, com os quais nos identificamos cada vez mais.
- Se é que tal termo “milionar” existe na língua de Camões, o Luís.
- Que até é a minha figura pública preferida.
- Até o nome é todo maoista-capitalista. Popular dizem eles…
- Unidades informáticas comuns, gigabyte ou terabyte em que GIGA é o factor de 1,000,000,000 vezes superior e TERA representa algo que é 1,000,000,000,000 vezes superior.
- Sexuais, neste caso!