ACS é uma sigla composta pelas iniciais de um nome mediático em Portugal: António Costa Silva. Bem, respeitinho é coisa que eu gosto e por isso vou chamar este senhor da forma que ele, com certeza, gosta de ser chamado, Professor Doutor Engenheiro António Costa Silva. E fica-me a dúvida se os títulos se escrevem em maiúsculas ou minúsculas…
Em tempos de pandemia, o nosso fofinho país está de novo em crise. Bem, de facto eu não me lembro de Portugal sem estar em crise. Por isso, o estado natural desta velha nação é um estado de crise e por isso retifico: em tempos de pandemia, o nosso fofinho país viu agravada a sua sistemática crise! Melhor assim, penso. Agora que sabemos que a seguir à crise sanitária veio o agravamento de uma já longa crise económica e financeira[1], foi necessário alguém ter uma ideia luminosa. E já que candeia que vai à frente alumia duas vezes[2], foi o nosso primeiro, de seu nome António Costa, que teve a ideia institucional de nomear um seu conhecido para nos indicar o caminho da salvação. E que conhecido do senhor primeiro é esse? O já referido Professor Doutor Engenheiro António Costa Silva. E é precisamente esta decisão do nosso primeiro que vai servir de suporte ao tema deste artigo, a arte de mal decidir quando não se sabe mais o que fazer. A decisão não foi necessariamente má, direi antes que foi inadequada. Muito pior é o nosso primeiro ter decidido fazer campanha pelo bandido[3] mais famoso em Portugal, o senhor Luís Filipe Vieira…
Com tanta miserabilidade a instalar-se desde Março deste ano no nosso país, era então preciso encontrar um Cristo para nos direcionar no caminho da salvação e, se tal se aprouver, morrer por nós em caso de falhanço. Foi então encarregado de tal desiderato, o senhor ACS[4]. Ao senhor ACS passou a competir a elaboração da “Visão Estratégica para o Plano de Recuperação Económica de Portugal 2020-2030“, a qual já foi publicada pelo dito cujo senhor aos 22 de Julho do corrente. Ou seja, a visão já temos! Não é mau, há quem não a tenha. A esses chama-se “invisuais” já que chamar “cegos” é coisa feia, não se deve. Estou em crer que antes da visão ACS, nós andavamos então às ceguinhas, o que me faz entender o porquê da sistemática crise portuguesa. Mas agora será diferente pois, já que temos visão, vamos poder olhar e ver o caminho até à salvação e remissão dos nossos pecados. Vamos finalmente olhar e ver, porque muitos de nós olham mas não vêem. Vamos então caminhar, pé-ante-pé, com a certeza do chão que estaremos a pisar. Com segurança. Com determinação. Com a certeza de quem sabe para onde fica o norte, porque o norte é o sentido a seguir[5]…

Visão estratégica…
Não sendo eu um leitor (nem bom nem mau, apenas não sou), claro que não iria ler 142 páginas de visão. Olhei a coisa assim por alto porque a idade já não me permite olhar as coisas nem muito ao perto, nem muito ao longe. Mas de facto, a visão ACS parece-me padecer de hipermetropia e miopia! O senhor até pode ser professor, doutor e engenheiro mas está velho e ultrapassado. Não porque os velhos são forçosamente ultrapassados, até conheço vários bem atualizados e e de visão futurista, mas este senhor por acaso parece que deve ter sofrido algum trauma em Angola, terra onde é bem possível sofrer traumas. Eu passei por Angola e realmente aquela gente está uns 50 anos atrás de nós. Atenção, não disse atrasados. Disse e digo “atrás de nós”, que é bem diferente. Bom, se não foi Angola que o transtornou, talvez possa ter sido o facto de ter estudado muito para chegar a professor, doutor e engenheiro. É que eu, apenas lendo a coisa por alto, fartei-me de ver coisas por demais batidas e sobejamente provadas pela História como inúteis e ainda muita lenga-lenga moderna que só se diz porque fica bem dizer. Esta Visão ACS é um compêndio de coisas ao estilo do antigamente, muito antigamente, bem lá para aqueles tempos em que muito boa gentinha inventava fórmulas para fazer de Portugal um país rico, próspero e de modo que as suas gentes fossem dotadas de litros e kilos de felicidade ao mesmo nível dos países dianteiros da Europa. Por exemplo, António Oliveira Salazar teve a sua visão: manter o povo na ignorância, dar ao povo algum acesso escolar mas não lhe ensinar mais do que os caminhos de ferro, os rios e afluentes de Portugal, sugar os territórios ultramarinos até dizer chega e assim manter as reservas de ouro ao mais alto nível e, “crème de la crème” da visão, viver orgulhosamente sós. Resultado desta visão? Ainda somos um povo de pensamentos e ações provincianos…
É fácil dizer mal, dificil é fazer as coisas e bem. Certo, mas eu não fui pago para ter uma visão estratégica e por isso limito-me a sentar-me confortavelmente à frente do computador e a teclar umas coisas fixes sobre o que certo e determinado professor, doutor e engenheiro engendrou, também sentado à frente do seu computador mas a ganhar balúrdios por isso. E eis então alguns poucos raios desta visão fantástica. Alguns poucos, porque eu não sou muito de ler 140 páginas escritas por um visionário.
Enfrentar o envelhecimento da população portuguesa.
Pimba, génio! O ideal é deixar o COVID-19 tratar do assunto. Mas para aumentar a eficácia é promover umas raves com os velhotes, deixá-los entrar sem máscara, substituir o gel desinfetante por água, contratar bandas rock da pesada, assim tipo “heavy metal” a dar bué de decibeis em cima deles e deixá-los andar aos beijos e aos abraços. A outra solução é ensinar as criancinhas, desde já, que velhote é coisa para ser deixada abandonada porque assim morrem mais depressa. Hey pá, bem mais eficaz e divertido do que dizer que se deve investir numa “aposta na investigação e desenvolvimento tecnológico, para o país se tornar numa plataforma apetecível de trabalho em setores tecnológicos avançados, ligados à inteligência artificial, ciência de dados, tratamento e processamento de informação, máquinas que aprendem, computação avançada, biotecnologias, espaço e outros setores capazes de atrair e fixar jovens talentos“.
Dar atenção à necessidade de aumentar a eficácia dos reguladores.
Pimba, génio! Num dos países de mais elevada corrupção da Europa? É já a seguir… Vamos ter todos os reguladores a regularem o Banco De Portugal que tem permitido as telenovelas financeiras tipo Novo Banco. A regularem as operadoras de telecomunicações MEO, NOS e Vodafone, das quais é fácil ver os respetivos presidentes de administração juntos em grandes jantaradas enquanto combinam manter equivalentes os preços dos serviços, que “por acaso” até são dos mais altos da Europa. A regularem as petrolíferas que ainda mantêm aquele antigo hábito de elevarem em tempo record os preços quando o petróleo sobe e de se esquecerem de os baixar quando o petróleo desce. A regularem a EDP e seu “honesto” presidente, António Mexia, afim de evitarem que na conta da eletricidade paguemos as férias e os fins de semana de todos os diretores e subdiretores da função pública, para além de muitas mais despesas em coisas que nem sabemos que existem. Vai resultar, claro, regular os reguladores! Mas quem vai regular os reguladores? Outros reguladores, duuuhhh… Ah, tá bem, nova profissão em Portugal: regulador! Assim tipo Brasil, onde bandido regula bandido…
A reindustrialização do país deve assentar em empresas que funcionam como unidades produtivas digitalmente integradas, que casam o mundo físico e digital, para crescer nos mercados europeus e globais.
Portugal industrial? Brincamos? Num país onde se acredita piamente que o sucesso da empresa está apenas na quantidade de horas que os seus trabalhadores cumprem? Num país onde mais horas diárias de trabalho se cumprem e mesmo assim somos um dos mais pobres da Europa? Num país onde se confunde produção com produtividade? Num país onde não se sabe qual é a diferença entre eficácia e eficiência? Num país onde as reuniões de trabalho são consideradas perda de tempo por muitos empresários e onde as mesmas, onde existem, são das mais ineficazes da Europa? Num país onde os empresários ainda só certificam as suas empresas por isso ser apenas exigência dos seus clientes? Num país onde os jovens se agarram a um curso de engenharia a pensarem numa bela cadeira de um espaçoso gabinete com vista para o mar? Já agora, se temos assim tanta vocação industrial, porque razão as poderosíssimas indústrias textil, calçado, conservas e cortiça, outrora líderes mundiais, resultaram numa série de ruínas espalhadas por esse país fora? É que Portugal ainda não passa de um país de patrões, bem ao estilo da outra senhora. Daquela que, após 46 anos, ainda faz parte dos nossos sonhos e das nossas realidades. Empresários? Sim, felizmente que têm aparecido alguns nas últimas décadas, principalmente desde que nos propusemos a aprender com a Europa…
A Visão ACS é apenas uma visão. É um ato consultivo apenas. Um visionário, é o que é o senhor ACS. Não um executivo. Não um decisor. Não um planeador. Óbvio, a Visão ACS não é um Plano ACS. Na indústria funcionamos mais ou menos assim: temos um problema, identificamos as causas e os efeitos, geramos um plano de ações, definimos as datas de resolução e atribuímos os recursos em conformidade com as dificuldades e os tempos de realização das tarefas. Adicionalmente, elaboramos um plano de contingência que inclui soluções alternativas caso as primeiras falhem, sempre tendo em mira a minimização de custos. E na política, como é? Temos um problema, identificamos os culpados, tentamos liquidá-los e substituí-los por gente mais ao nosso jeito, criamos um visionário para gerar uma visão, engendramos umas tantas manobras de diversão que evitem a criação de um plano de ações, entretanto chegam as eleições e isso já é assunto para outro. Tão bem pensado, melhor executado. São espertos, os políticos. E quem manda neste mundo são os espertos. Vá, não culpemos os políticos por serem políticos. E nem culpemos os visionários por serem (principescamente) pagos para visionar. Seria o mesmo que culpar o pároco por pregar o amor ao próximo ou o médico por passar receitas. A Visão ACS é apenas uma visão mas também a expressão da nossa tendência natural para nos enganarmos uns aos outros, incluindo a nós próprios. Num outro país não tão latino nem tão periférico, em vez de se nomear um visionário teria sido criada uma associação de vários colégios de especialidade para efetuar um exaustivo levantamento dos problemas e elaborar propostas de solução concretas. Mas isso seria se não fossemos um povo tão latino e periférico…
Estamos tão habituados a viver em crise sistemática e sob tão elevado consequente stress que não saberíamos viver de outra forma…
- Para mim, os bancos continuam em grande crise logo, estamos perante uma crise financeira. E se mais não houvesse, o Novo Banco bastaria por si só para nos levar à falência…
- Um dizer estúpido quanto baste…
- Na qualidade de membro de um bando, o Sport Lisboa e Benfica.
- Por questões de poupança das pontas dos meus dedos, vou usar esta sigla para designar o Professor Doutor Engenheiro António Costa e Silva.
- Gosto desta, estive bem! E nem sequer é porque sou do norte de Portugal…