A História Explica

A História é um mero relato, por uma ou várias pessoas, de um conjunto de factos acontecidos na ordem arbitrária em que aconteceram em resultado da actividade da humanidade. A História não explica nada mas pode ser usada como ferramenta de suporte a certas conjecturas sobre a actividade humana, no presente e no passado, ou eventualmente a certas previsões sobre a mesma. Cada país tem a sua História e, claro, a mesma poderá ajudar na definição do seu perfil nacional e, por consequência, no comportamento das suas gentes. Será que a História de Portugal nos ajuda a entender porque é Portugal um país mendigo no contexto da família onde se inseriu em 1986?

António Costa, actual primeiro-ministro de Portugal e líder do Partido Socialista, fugiu à incómoda pergunta feita pelo jornalista, “Como explica que Portugal tenha já sido ultrapassado pelos países de Leste em menos de 20 anos?”, com a patética resposta: “A História explica!”. As reações dos partidos concorrentes nestas Legislativas 2022 não se fizeram esperar e nisso eu estou de acordo, a História não explica pois quem deve explicar é quem governa, governou e quer continuar a governar. A História não explica, no máximo ajudaria a explicar. Que a História nos diz que Portugal deixou há muito de querer ser um país líder para passar a ser um país liderado, isso sim, está na nossa História. Se a nossa História nos ajuda a explicar o porquê desta nossa subserviência, isso não sei mas que tal subserviência é um facto, sim é e por isso mesmo vamos ficando pela cauda da Europa, limitando-nos a passivamente ver passar por nós certos países que mais recentemente aderiram à União Europeia, também eles caraterizados por franca pobreza nacional.

Vamos lá então tentar perceber o “A História explica!” e admitir que o “produto interno bruto[1] por habitante[2] é um indicador da riqueza de um país. Juntemos-lhe a “paridade do poder de compra[3] que, simplificando, é o poder de compra de um cidadão se o considerarmos a comprar numa “aldeia global”[4]. Vamos então comparar os atuais 27 países da União Europeia aceitando a minha classificação regional de países do Norte (os super ricos), Centro (os ricos), Periféricos (os quase-ricos) e Leste (as pobres vítimas de regimes como o Soviético ou Pró-Soviético). Considerando que muitos dos países de Leste aderiram à UE em 2004, vamos usar esse ano em comparação com o último ano com indicadores económicos conhecidos (2020) para tentar ver quem ultrapassou Portugal nesta competição interna no seio da União Europeia.

Pela tabela anterior vemos que, em 2004, Portugal ocupava a 17ª posição no ranking da UE e nessa altura só existiam países de Leste abaixo dessa posição, excetuando a Eslovénia (15ª posição).

Por esta última tabela vemos que, dezasseis anos depois (2020), Portugal desceu para a 20ª posição e abaixo dela só há países de Leste e a… Grécia. Ou seja, neste período de 16 anos, Portugal foi ultrapassado por:

Pelo andar da carruagem, seremos ultrapassados pelos restantes membros do Leste e então iremos disputar o último lugar do ranking com a Grécia! Pessimista? Não, conhecedor do povo que somos e algo conhecedor dos povos que os outros são. Relembro que a Checoslováquia, sujeita a uma cisão pacífica em 1993 da qual resultou a República Checa e a Eslováquia, era uma potência mundial na indústria metalúrgica e metalomecânica, com indústria automóvel própria[5]. Recordo ainda que todos os países do ex-bloco Soviético promoviam nas suas populações o gosto pelos estudos e pela arte, o que fazia com que o nível de escolaridade e de literacia das suas gentes fosse bastante elevado, muito mais que o que Portugal alguma vez teve. Por outro lado, muitos destes países possuem uma cultura de trabalho muito próxima da alemã ou holandesa, o que os torna uns profissionais de alto rendimento que, por sua vez, é um importante contributo para a elevada produtividade das suas empresas. Após a sua libertação do jugo soviético e agora com a motivação gerada pela adesão à União Europeia, estes povos sentem-se impelidos a melhorar substancialmente as suas condições de vida, a todos os níveis, tornando-se altamente competitivos no contexto de uma região económica no topo mundial. Exatamente o que falta a Portugal…

O Portugal de hoje é melhor que o Portugal de 2004. O Portugal de hoje é muito melhor que o Portugal de 1974 (qualquer comparação seria um atentado ao bom senso). O problema é que já passaram 36 anos desde que aderimos à União Europeia[6] e não temos nunca deixado de ocupar a cauda da Europa. A nossa taxa de evolução é baixa e tal é tornado por demais óbvio por factos como este, em que países bem mais pobres conseguem ultrapassar-nos em cerca de 16 anos. Então a História rezará que Portugal não conseguiu, em cerca de 4 décadas, aquilo que outros já conseguiram em cerca de década e meia. A História rezará que Portugal vive da caridade dos outros e já se acomodou à mendicidade…

A História não explica! A História apenas relata factos. E contra factos não há argumentos…

  1. PIB ou, em inglês, GDP – Gross Domestic Product
  2. Per capita.
  3. PPC ou, em inglês, PPP – Purchasing Power Parity.
  4. Economia nunca foi a minha praia e por isso prefiro esta imagem para o PIB (PPC) como o que seria o poder de compra de um cidadão no mundo onde todas as questões como câmbios, custo de vida, níveis salariais, etc, estariam normalizadas.
  5. Škoda Auto é uma marca de automóveis checa, embora hoje em dia seja uma subsidiária da Volkswagen.
  6. Naquela altura chamava-se Comunidade Económica Europeia (CEE).

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